O par de sapatos que não lhe cabia bem estava jogado em um canto. Os havia comprado na esperança que lhe deixassem mais feminina, deixaram-na com vários calos e um calcanhar machucado que coçava. Molhava sua mão na pia e passava água neles, com a esperança que doessem menos. Não funcionou.

Voltou e sentou na cadeira de jantar. Recebeu um olhar tímido de preocupação de Laura que percebia que algo errado estava acontecendo. Decidiu então sorrir profundamente e elogiar a comida da sogra, que não estava nada feliz colocando a panela quente na mesa com ajuda de uma toalha. Seu sorriso foi reciprocado pelo pai que sorria de forma amarela, pensando que deveria apoiar a filha.

Serviram-se. A dor nos calcanhares era cada vez maior. Mal prestou atenção ao sabor da comida, mas manteve o sorriso e elogiou-a. Laura olhava para o prato fixamente. Ao ver essa cena, tentou falar bem dela para os pais, mas a mãe falou que ela fazia escolhas muito estranhas e o pai continuou com seu sorriso amarelo. Quase chorando de dor, assumiu que essa era a escolha dela. Sorriu. O cachorro estava deitado no chão observando tudo, a coleira em seu pescoço.

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A ideia desse texto era ser feito usando a teoria da bolsa da Ursula K. Le Guin. As instruções eram: escolher 5 objetos que não tenham nada a ver um com o outro e escrever uma história curta fazendo com que esses items apareçam de forma destacada. Além disso, outra pessoa tinha que escolher os itens para mim e sortear. Para isso contei com a ajuda da Laura que escolheu 5 itens aleatórios da casa dela e eu os sorteei num sorteador online. Como agradecimento coloquei o nome dela numa personagem do conto.